A oitava edição da Blogagem Coletiva
#DesarquivandoBR.
E desta vez recuperamos a memória de um dos momentos mais funestos da história brasileira: O Ato Institucional número 5. O AI5, de 13 de dezembro de 1968.
A convocação da blogagem, aqui:
http://desarquivandobr.wordpress.com/2013/12/05/convocacao-para-a-viii-blogagem-coletiva-desarquivandobr/
O Brasil precisa recontar sua história. Pedagogicamente. Insistir em recuperar dados memórias, histórias, fatos. E gentes.
A ditadura civil militar brasileira é das piores máculas. Mas ela ainda marca, cada um de nós. Nossa apatia, nosso conformismo, nossa crença de que não vale a pena. Nossa baixa estima. Nossa mania de acreditar que somos assim por alguma força divina, genética, molecular. A impunidade dos agentes da ditadura, que torturaram e mataram, é a impunidade dos agentes de estado que torturam e matam. As covas de opositores do regime são as covas dos fora-da-lei, dos negros, dos pobres, dos indigentes. E AI 5, funesto, são as prisões abarrotadas, os presos sem o devido processo legal - os presos pobres, os que são presos por portarem vinagre, por roubarem doce.
Não nos esqueçamos. Fingir que não existiu, menosprezar, relativizar, não é deixar de ter pesadelos. É só, e somente só, fugir: de nós mesmos.
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Levantou o braço, esperou. A classe
naquela algazarra de fim de semestre, fim de ano, fim de provas, festa. Uma
solene bagunça. A professora tentara, um pouco, ainda, cumprir o programa. Mas
nada mais seria possível, desconfiava. Mas ali, no canto, um braço erguido.
Também solene.
Como que aquelas cousas sempre
ficam e marcam e restam, o braço erguido ali queria dizer algo. O barulho foi
aquietando. Um e outro cutuco. Um “olha
lá”, “que será?”, “o que é?”. Alguma curiosidade. Alguma incredulidade.
Pois bem. Silêncio. A bola voltara
misteriosamente para a professora. Que tinha a senha. Mas tinha lá seus
receios... afinal... o ano já estava ao fim, acabando, findando, cansaço,
adeus, até o ano próximo, boas festas.
“- Posso ajudar?”
“- Professora, o que foi o Ato
Institucional nº 5?”.
A classe fez um muxoxo. Será que
ainda teriam que mais um pouco de aula? Será que todos já não estavam com seus
devidos sacos repletos de impaciência e incontinência? Ato institucional... E
ainda por cima o cinco? E o um, o dois, o três e o quatro?
Mas antes de voltar o zunzunzum...
“- Minha vó morreu por causa disso.
Meu avô também, de desgosto. E meu pai até hoje dorme com a luz acesa no
quarto. Explica, professora, por favor...”
Morte, desgosto, luz acesa para dormir e a confissão explícita de alguma
vergonha, medo. Eram tópicos que qualquer aluno saberia relevante, importante, preocupante.
“- E eu li que este AI-5 faz
aniversário hoje, professora, 45 anos.”
A professora respirou fundo. Sabia
que não escaparia: o silêncio na classe.
“Não foi só sua avó que
morreu. Fomos todos nós, um pouco. Nem
seu avô, fomos todos nós, mais um pouco. E a luz acesa, a única capaz de
acalentar o pesadelo do seu pai, também é este silêncio aqui... porque tem
muita gente que só consegue dormir porque desconhece a verdade. Porque muita
gente não dorme mais, há tempos. E porque nós, nós todos, o país inteiro, ainda
não tivemos coragem de responder a esta sua pergunta.”
E desatou a explicar. Não só o ato
e aquele distante 13 de dezembro de 1968, mas também.
O silêncio da classe, as lágrimas de
alguns. Sim, os risos e a indiferença de outros. Mas que agora não eram fruto de alguma
ignorância ou desconhecimento.
“-Obrigado, professora.”