quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Cartão de Ano Novo - Que venha 2013!


Já que o mundo...

É que uns vão viajar, outros vão sumir das internets, outros sei lá o que. 

Então, para quem visita a quitanda:

Saiu do forno a ceia de ano novo!!!


__________________
 

Notas sobre o fim do mundo e desejos dum mundo novo!



Outro dia ouvi que o mundo ia mesmo se acabar. Desconfio que um dia irá, mesmo. Ainda que seja o fechar de olhos. Sou dos ateus que acreditam em deuses e deusas, sobretudo estas, mas sempre no plural. Faço oferendas aos santos católicos, principalmente Francisco e Benedito. Gosto da igreja perto da minha casa na infãncia, por causa da luz, luz mesmo, do sol, quando entra pelos vitrais. Gosto daquela igreja ali na Liberdade, pequenina, numa travessa, tem cara de milagres. Faço questão de acender incensos em casa para acalentar aqueles que me visitam, e são muitos, embora de espiritismo tenha só as histórias da família por parte da minha mãe, principalmente da Vó Teresa, e da minha saudosa madrinha, Jane, tia do meu pai. Afago Iemanjá quando vou ao mar, pensando nela e torcendo – pedindo – para que ela leve as coisas ruins com as ondas do mar. Ponho os pés numa bacia de sal grosso e tem gente que eu não gosto de ficar muito junto, porque saio pesando uns dezoito quilos a mais.


Sempre acreditei muito nos homens e nas mulheres e ando a aprender que há homens-mulheres, mulheres-homens e acreditar muito neles. Por isso tenho os deuses e as deusas nas minhas preces, que são conversas comigo mesmo, meus infinitos. Mas ando com uma descrença que beira o desânimo. Porque cada vez mais somos “arenas” com almofadas do que estádios com bandeiras, somos cada vez mais só cerveja importada, carro do ano, televisão de plasma, mais prédio de escola do que espaço que educa, mais governabilidade e menos tesão, mais posto de gasolina e menos sapataria, mais grife que alfaiate, mais falo viril varonil do que pinto.

Sincera, e honestamente, o mundo não acaba no dia do calendário maia. E não é porque eu não acredite nessas bobeiras, que de bobeiras tem só o erro na data e as catarses injustificadas justificadas só para ganhar uns trocos. É este maldito desânimo que insiste em ser enfrentado pelos meus botões, pelo “bola pra frente”, “me faz um carinho, neguinho”, “cafuné, dengo, mamulengo, saudade, chocolate”, “pai, me dá cá um abraço”, “eu te amo”, os vestidos floridos, os girassóis, os tubinhos pretos básicos, bola de futebol, torresmo e cousinhas assim, aqui, ali, alhures e acolá. E com o sorriso de quem me lê.

E que apesar do fim do mundo, há muitas linhas que ainda não escrevemos.


Feliz Ano Novo!!!



quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Os maias só queriam eram vestidos floridos

 






Acordou totalmente empapado, suor. É verdade que lá fora fazia um calor de matar guarda, mas era verão, ou quase, e o calor da cidade já era mais comum do que nota de dois reais naquela época do ano. E que a janela estava tão escancarada que a luz do sol, lá pela hora do relógio, deu bom dia, boa tarde e quase antecipou o boa noite. Mas aquele suor todo era novidade.



Naquele levantar trôpego caminhou lentamente para o banheiro. Pensando na vida, desde cedo. Na conta do cartão de crédito, no crédito imobiliário, na chance de pegar um coletivo menos cheio. Mas aquela camisa molhada lembrava era da noite, do sono, trazia perguntas outras. Quem diria que esse calor ia fazer suar tanto?



No fim, escovado os dentes, água na cara, ainda deu tempo de voltar ao quarto e tentar esticar um pouco mais o sono. Aqueles cinco ou dez minutinhos que fazem toda a diferença, que noticia como será o dia: de fastio ou de intuição. Deitou...



Ela era linda, naqueles olhos que dialogavam com a boca, no sorriso que perfumava o busto, nos seios que alegravam o mundo, no doce meneio. Nem sequer se lembrava de conhecê-la direito, de nenhuma tarde de praia, de pouca conversa. Mas se gostavam, empatia e aquela coisa que faz querer bem um outro. Nada de flerte, rosa, poesia, pé de ouvido, no máximo um “Ebony Eyes” nalgum bailinho de colégio, na adolescência. E, sim, teve aquele dia em que se encontraram sem querer no meio da rua, tomaram um café e cambiaram  confidências, daquelas confidências de folhetim: pouco mais que uma conversa de elevador, mas bem menos que novela. Neste dia, lembra, pensou com os botões em convidá-la para um chope.




Toda vez que um vestido aparece, qualquer vestido, há sempre uma chance real do mundo virar um lugar realmente fantástico. De uns tempos para cá, inclusive, até pensou em encontrar um sarongue ou mesmo um desses escoceses. Porque se nas mulheres é aquela lindeza toda, quem sabe... Mas os floridos, ah... os floridos. Qualquer encantamento, arrebatamento, apartamento, só para fazer rima. E ela, num florido, notou. E o despertador.




Correria. Aqueles dez minutos viraram quinze, viraram até sonho. E a pressa, que nunca é virtude, toma conta do ânimo. A velha história do exagero: o soninho de dez minutos, restaura. O de quinze, fustiga. Fustigado, foi ao banho, tomou café em pé, correu para o ponto e teve certeza que teria um dia complexo. No ponto, ao lado da banca, o jornal dava conta das notícias de sempre. É notável como os jornais se aprimoraram, com o passar do tempo, a dar as mesmas notícias todos os santos dias...




No ônibus cheio se lembrou do sonho... dela... do vestido... E teve uma vontade varrida de doida de descer correndo no primeiro ponto, procurar se tinha o telefone dela na memória do celular e mandar um oi. Achou que o tal sonho era algum pressentimento, loteria, morte, vestibular ou saia rodada: sabe-se lá os meandros da mente e da alma humanas....




Na mesa do escritório, o calendário: 20 de dezembro. “Puta que o pariu!!!! O mundo acaba amanhã!!!” Riu, farto. Aquela história de calendário maia, de fim de mundo e cousa então. Ao menos valia a brincadeira, valia assoviar Assis Valente no “E o mundo não se acabou”... “beijei na boca de quem não devia”... “peguei na mão de quem não conhecia...”. Outro café.




E ainda sorrindo com o fim do mundo foi dando aquela agonia, aquela dor inexplicável entre o ânimo e o queixo, aquela vontade súbita de gritar algum palavrão escabroso. Aquela apatia de querer logo que a profecia estivesse corretíssima e que fosse antecipadíssima.




“É isso!!!!” E saiu correndo só parando na primeira florista que encontrou. No girassol mais bonito que encontrou mandou bilhete: “Dizem que o mundo acaba amanhã.”



12. novembro, 05.

Obs.: para ler e depois ouvir Assis Valente, na versão mais famosa, na voz da Carmem Miranda: http://www.youtube.com/watch?v=abVNWgeonOY

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

"... o canal da copa..."

O recreio do perna de pau



Era uma partida na quadra da escola, recreio e era a final do campeonato daquele recreio. Era a Mariana da terceira série B  e eram a quadra lotada de invejosos  espectadores, o professor careca e a orientadora pedagógica. Era tudo isso e o gol complemente vazio. O gol escancarado, pleno, absoluto, sem goleiro. Todos sabem que o gol tem gosto daquele barulhinho da bola quando estufa a rede, não sabem? Se desconhecem os cheiros, os sabores, as cores do gol desconhecem praticamente tudo na vida, posso afirmar, atestar, asseverar. Quando o João me passou a pelota,imediatamente começou a gritar gol. Eu também. Daqueles gritos da alma, que as pernas arrepiam, os olhos brilham, a saliva seca para depois encharcar. E a bola veio linda, redonda, livre, liberta. Os pés a beijaram, um ósculo maravilhoso, um encontro perfeito. E não era hora de maravilhas e cousas dificílimas: era deixar o beijo e correr para o lado da Mariana, sorrindo e gritando “GOL”. Simples, fácil, grandioso, apoteótico. Ouvi o grito do João, o piscar da Mariana, a ofegante orientadora dizendo que o intervalo tinha acabado. E o apito do professor careca. E o barulhinho da macia rolando pela quadra... GOOOOOOLLLLL.... Traff. Traff?

Aquele som nada tinha de glória, nada tinha de golo, nada tinha de Mariana, nem de recreio.  Era a gorduchinha abraçando a trave com gosto e saindo dizimada pela área. Eram meus nervos todos caindo no chão, a anedota, a ignomía, o palavrão do João, o riso do professor careca. Era o silêncio e um monte de gente gritando “errou, impossível, cruz credo, ave maria, ruim, perna de pau, caçarola, grosso, besta”.  Eram meus pés tropicando na própria vergonha, na própria linha do obtuso:  para mim o mundo podia, deveria, merecia ter acabado naquele átimo. Soubesse o que era um enfarto, seria ali. E só. Caído no chão. Tento me esconder na névoa do vexame e uma mistureba de risos, de cânticos, de morte, de solidão e de ingratidão. E Mariana, como quem ama e ainda por cima faz rima, ainda vem com o desfecho final: “Vem, o recreio acabou.” E dá a mão para o goleiro, que ressuscitava nas chamas do meu inferno. Naquele dia, morri: ali, entre as redes e a pilhéria. E nunca mais nasci igual.

23.02.2010

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Cócegas como sanção

 
 
O papel do legislador
O original, aqui: http://www.facebook.com/Quodores/posts/193140317485981
 
 
Exercendo o papel de magistrado...

Bom... jogavam pebolim na sala... um "totó" daqueles pequenos, sem mesa, para jogar no chão.

Pela primeira vez em zilhares de anos o Pequeno aplicava uma sonora goleada no Grande. Óbvio, utilizava de escaramuças diversas e aproveitava a aparente boa vontade do irmão mais velho... "Pênalti!!!" E colocava a pelota na frente do atacante e mandava ver... ainda reclamando com o outro: "Ó... não vale mexer nenhuma peça! É cobrança de pênalti!"

O Grande levava na esportiva, embora fosse só um disfarce da alma.

Lá pelas tantas, o Pequeno sai pela sala comemorando a vitória maiúscula.

Quando olha para trás, o Grande tinha mexido no placar e fazia um tento de empate, quase colocando a bola dentro do gol. Pronto...

O Pequeno rugiu em fúria. Ficou vermelho, raivoso, emputecido. "Você está roubando!!! Isso NÃO vale!!!" E partiu para o confronto.

O outro, ria. Mas percebeu-se em apuros.

Tive que intervir: "Chega! Vamos acabar com esse jogo. Quem não sabe brincar, também não joga!"

....

Minutos depois, mudaram de brincadeira. Com uma figurinha do D'Alessandro do Internacional de Porto Alegre ("Pai... olha... é uma figurinha Do Alessandro, do Náutico!") começaram uma renhida batalha de bafo.

O Grande anda a aprender mumunhas do jogo. "Olha, isso não vale, quinô." (Nota da redação: quinô é quando a figurinha ao virar fica apoiada em alguma coisa, não completando totalmente a "virada", o popular "deu quina nalgum lugar"). E o Pequeno, ia aceitando, sem muita certeza de que a regra estava correta.

Bem.. a toada seguia. "Opa! Assim não vale... deu colinha!". "Sim, desse jeito pode... é "canoa" e a gente pode assoprar!" (Nota da redação: "canoa", desde antanho, é quando a figurinha fica em formato de barco e podemos fazer vento com as mãos para ela virar). Evidente, o humor do Pequeno foi se alterando, para pior.

Percebi. E, rápido, ligeiro, antes do caos, estabeleci regras. Sentado ao lado deles, no chão, mandei: "Olha, se o Pequeno ficar bravo eu pego e faço cócegas" - E pequei o menino e desatei a fazer cócegas. Os dois riram, amenizaram a disputa. "E se o Grande provocar.... também faço cócega." E dei um susto no mais velho, fazendo-o contorcer. "Eu sou o juíz!".

Enfim, lá pelas tantas, depois de cócegas aqui e alhures, o Pequeno pegou as manhas e começou a vencer... E, óbvio, começou a sacanear o outro. Que ficou contrariado, quase que visivelmente. Antes da cousa descambar, soltei:

"Olha, Pequeno... não é porque você pode provocar que você pode exagerar... você está extrapolando seus direitos... vou fazer cócega também!!!" O outro abriu o sorriso.

"E você... se ficar bravinho... também...".

Depois de algum silêncio (e depois de perguntarem "o que é extrapolar?")... os dois pulam em cima do pai. 
"Paiê.... faz cócega!!!".

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Em SP, para virar a página



O último texto sobre as eleições deste ano...

Para quem tiver saco e paciência.

Obrigadão.

__________________________

Para virar a página


O ano? 1988. Era ano de eleição para prefeito. A sucessão de Jânio da Silva Quadros. Poucas vezes a maluquice de São Paulo foi tão categórica: Jânio era um zelador caricato de costumes, uma personagem, um triste retrato desbotado. Não tínhamos dois turnos e acabou vencendo a eleição Luiza Erundina de Souza, do PT. Oito de cada dez moradores de São Paulo, hoje, admite: poucos governos em São Paulo foram tão bons quanto o de Erundina. Na época, é verdade, teve todo tipo de preconceito para enfrentar e foi infernizada por todo mundo que detinha alguma rotativa industrial.

Mas quero chamar a atenção não para a vitória de Erundina. Nem traçar um paralelo com o atual cenário, tendo em vista que ocupa o cargo de prefeito outro desses zeladores de costumes, muito menos carismático que o retrato desbotado. Quero chamar a atenção para... o PSDB.

Naquela eleição o candidato à prefeito pelos tucanos foi José Serra. Sim, este aí. Na verdade, aquele era outro, embora sendo o mesmo. Duas personagens. Era a primeira eleição do PSDB, que acabara de ser fundado em razão de rusgas internas no PMDB do governo Sarney e, sobretudo na sucursal paulista da legenda, com o governador Orestes Quércia. Naquela eleição foram eleitos vereadores pelo PSDB. Cito alguns de memória e sem recorrer ao gúgol: Marcos Mendonça, Paulo Kobaiashi, Arnaldo Madeira. Era um partido que tinha um discurso do “novo”, da preocupação programática para se distanciar do quercismo e já um discurso de “mais ético” em contrapartida ao desmazelos repetitivos que marcaram a gestão peemedebista nos governos federal e estadual.

Mas a questão da “ética” e da “moralidade” eram coadjuvantes. Importava mais a visão de descentralização de poder, presença marcante nos discursos do ex governador Franco Montoro, e a experiência da gestão Mário Covas como prefeito biônico na cidade, que, de fato, foi diferenciada: vivíamos o fim institucional da ditadura e Covas foi prefeito depois de figurinhas como Maluf, Colassuono e Reinaldo de Barros – cousa nada elegante – o que significou para além de novos ares, nova forma de fazer política.

Passados os anos, o candidato do PSDB ainda é José Serra. Mas não há mais descentralização de poder e a gestão Mário Covas é algo que soa tão antigo como CMTC, bonde ou “passeio público”. Entre os vereadores mais bem votados do PSDB estão um ex coronel da ROTA, que se vangloria de ter matado mais de trinta pessoas, “banditos”. E um ex secretário com nome de conde que se vangloria de ter colocado grades em prédios públicos para que mendigos não aporrinhassem o saco de transeuntes dignos no centro da cidade. Não é pouca coisa esta degeneração do PSDB. Só quem acredita na barbárie pode comemorar que um adversário político tenha chegado neste ponto... Até outro dia também não havia programa de governo. Até outro dia, também, não havia nada de proposta que não fosse apostar no erro alheio, exaustivamente como fumaça para o próprio desterro.

São Paulo pode ser chamada de conservadora. Não combina muito com as diversas esquinas da cidade, mas, sim, pode ser chamada de conservadora. Mas a total ausência de um mínimo de preocupação com o discurso (notem, uso a palavra discurso e não a palavra “prática”) humanista, a utilização de um preconceito como instrumental de campanha (ora, chamar o material pedagógico contra a homofobia de “kit gay” é de uma indelicadeza atroz, espalha – esparrama, na verdade – preconceito como baba), a consagração do valentão discurso e prática do “bandido bom é bandido morto” (e inevitável lembrar de um jingle malufista de eleições pretéritas - “gente boa é na rua”) não pode ser chamado de uma política “conservadora”. É mais que isso. Muito mais: é reacionarismo, para dizer o mínimo.

Sim, os puristas vão me “policiar” dizendo que estou defendendo o velho PSDB, em que meu pai e minha mãe votaram naquela distante eleição de 88, e que isso não combina com meu esquerdismo juvenil. Outros irão lembrar que eu mesmo comecei votando no PSDB de Covas, nas eleições presidenciáveis de 1989, meu primeiro voto, para fazer algum tipo de troça. Não ligo. Minhas posições políticas foram sendo contruídas e, sim, a gente pode mudar, se transformar, lutar. O que me entristece é quando percebo o retrocesso, a regressão.

Votar em José Serra é isso: regredir. E, pior, dar sobrevida a um político que, por seus méritos e muitos deméritos, tem feito de seu capricho em querer ser presidente o único mote, o único discurso, o único tapete. Não querer votar no Haddad, no PT, no outro – e muitos que tem conversado comigo tem dito isso – pode até ser um posicionamento. Mas que não se faça disto a justificativa para votar no Serra. Anule. Venha ser oposição, não dói e a gente aprende pra caramba quando a oposição é feita com critério, com esmero, com paciência, com diálogo. Seja oposição. Mas não seja situação de algo que você não é.

Digo, por fim, que votarei no Haddad. Muito por ele, muito por amigos que gostam dele, muito por ele ter sido participado em alguns bons livros da coleção “Zero a Esquerda” da Editora Vozes – em especial o “Desorganizando o consenso”, que era uma coletânea de entrevistas feitas pelo Fernando Haddad, muito por ele ter participado do Centro Acadêmico XI de Agôsto (uma razão que, reconheço, meramente sentimental) e muito por ter um programa de governo que, embora não o dos sonhos, foi de alguma forma discutido e gestado por gente séria, preocupada e inovadora. Mas, na oposição. E para quem acha contradição pregar o voto com a frase “não seja situação de algo que você não é”, digo que ser oposição ao Serra não é tarefa salutar, porque, infelizmente, não pressupõe mais o diálogo.

Para virar a página, não vote em José Serra. É isso.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

"Você não me ama..."



Mais duas... que contam a mesma saga...

Do Pequeno e do Grande...

Ó lá, vó...

___________________________



Original, aqui: http://www.facebook.com/Quodores/posts/161888833944463


A verdade oculta na frase: "Ai... como seus filhos são fofos."

6:45: "Meninos.... vamos acordar, vamos..."

6:55: "Ei... posso acender a luz? Vamos levantar, vai!"

7:05: "Já são sete horas... vamos..."

7:15: "Bom dia, filhão. Tudo bem, alguma novidade?". "Bom dia, pai. Sim... não tenho novidade." (e ri da minha cara). "Cadê seu irmão?"...

7:20: "Filho, levanta... já são sete e vinte..."

7:30: "Filho, toma o remédio. E vai escovar os dentes, anda.".

7:35: "FILHO... Acorda, vai... são sete e meia! Vai chegar atrasado."... "Pai, você me obriga a tomar café da manhã, eu não quero...". "FILHO, LEVANTA E TOMA O CAFÉ."

7:40: "Pai... tô pronto." E se encaminha ao quarto e diz: "Se você não levantar, eu vou pegar o seu gibi, láralálarála.".... "Filho, deixa o seu irmão em paz... e FILHO, LEVANTA."

7:41: "Pai, você não deixa eu viver. Só quer que eu tome café da manhã!"

7:45: "Filho, nós estamos muito atrasados. Levanta logo e toma este café."

7:46: "Pai, eu não te amo."

7:50: "Renata Ferreira, você pode levar o Grande para a escola."

7:51: "Pai... porque na casa da minha mãe..."..... "Eita, nem vem com este papo! Toma este café.".

7:52: Com lágrimas nos olhos: "Pai, você é um monstro."

7:53: "Tchau, filho. Tchau, Rê. Obrigado. Bom dia. Bom trabalho."........ "Tchau, pai."...... "Filho! Deixa o gibi do seu irmão aqui, por favor, né?"....

7:54: "Tchau, Rerê. Beijo. Mas paaai, não quero o pão."

....

7:58: "Vamos... vamos... seu irmão já foi e você está muito, mas muito, mas muito atrasado."..... "Pai, o São Paulo ganhou ontem?"... "Ganhou, golaço do Lucas.... mas....PARA DE ENROLAR!"

7:59: "Pai, não quero tomar o iogurte." "Ok... vai escovar os dentes e vamos embora."

....

8:10: "Chama o elevador, filho."
....

8:25: Na porta da escola: "Tchau, pai. Um beijo.".

8:26: "Tchau, filhão, mas... anda... anda...anda... cê tá atrasado."

E saiu rindo janela. E eu também. Puta sono.



___________________


E a outra...



Original, aqui: http://www.facebook.com/Quodores/posts/165813973551949
Mais uma da série "Os cafés da manhã"

"Pai... você prefere que eu morra ao invés de não comer a fruta..."

"Filho! Que bobagem. Não fale uma coisa dessas, nem brincando."

Olhei para ele, com aquela cara de passado, mas com um baita sorriso no rosto, sabendo que tirava onda com a minha cara... e, então, complementei:

"Mas... come a banana, vai."

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Um guia perolar de viagem




Aqui na Quitanda também tem guia de viagem...

Como estou de saída para o Guarujá, sede de recreio da mercearia, recuperei uma missiva para dois grandes amigos, o Doutor Marcello Fraga e a Enfermeira Chefe e Única Responsável Renata Bortoleto.

Fiz umas adaptções no texto original...

Mas o "guia" segue aí. 

Espero que possa um dia ser útil...


_________________________





Desejo, com o coração pleno, que façam boa estada na “Pérola do Atlântico”, alcunha simpática da Ilha de Santo Amaro, popularmente conhecida por seu nome oficial: Guarujá.


Parte I – Localização e Dicas Específicas sobre como chegar.

Como chegar: Ao fim da rodovia Piaçaguera (nome oficial Rodovia Cônego Domenico Rangoni) chega-se a um semáforo. Entrem a esquerda (Av. Santos Dumont) Nesta avenida sigam reto, em direção a Praia das Pitangueiras (Centro). Passarão por debaixo de um viaduto (e a Avenida passa-se a se chamar Puglisi). Sigam em frente. Passando uma enorme agência do banco laranjão, a direita, atenção. Entrem a direita na Avenida Leomil (como referência, na esquina da Leomil com a Puglisi há uma “Maria Fumaça”, um velho trem enclausurado para exposição). Na Leomil, em frente toda a vida. Esta avenida tem um canal que separa as pistas. Sigam até o fim da Avenida e avistarão a praia das Pitangueiras, uma das mais belas praias urbanas deste território guarani. Ao fim da Leomil, entrem a direita, sentido Praia das Astúrias.

Neste trecho subam o morro (notem ao lado esquerdo, na pista contrária, o Edifício “Sobre as Ondas”, marco da arquitetura modernista). Seguindo reto e contornando o morro vocês vão cair na Avenida General Rondon (logo no começo dela, ao lado direito encontrarão um colégio Objetivo). Esta avenida tem o restaurante “La Plage”, que vende desde feijoada de frutos do mar até pizzas, passando por filés a cavalo e banana flambada, o que denota que quem sabe tudo pouco sabe – com exceção do Doutor Marcelo, óbvio.).

Nesta avenida sigam em frente, sentido Praia do Tombo. Passarão pela padaria “La Plage” (Sim, a La Plage domina tudo ali – o café lá é razoável e o pão francês só sobrevive cinco minutos depois de sair do forno, depois vira borracha). 

...

Chegando... 


Parte II – Notas sobre o Bangalô e dicas de utilização


O lar dos Amaral fica na praia das Astúrias. Uma sala ampla - com ventilador de teto e uma mesa para refeições de respeito, um banheiro amplo – com espaço para as mais diversas práticas esportivas, uma cozinha simpática e equipada, área de serviço e um quarto bem amplo equipado com maravilhoso ventilador de teto e um possante ventilador velho de guerra. São estas as acomodações do pequeno chatô.

Evidentemente, por ser um enclave do território Amaraleano, há muitos gibis do “Fantasma” para leitura. Mas o equipamento de som não é lá essas coisas, só dá para ouvir os jogos de futebol e as estações locais de rádio. A televisão é pequena e a imagem, uma bosta. Mas férias não são destinadas para assistirmos novelas, correto?

Na cozinha, infelizmente, uma porta despencou no armário que guarda pratos, copos e outras cousitas e ainda não foi feito o devido reparo. Mas no mais tudo funciona a contento, inclusive o micro-ondas (não sei se esta grafia está correta seguindo as novas orientações do vernáculo pátrio). O fogão é a gás e se o gás faltar, o nobre e elegante zelador do Edifício dispõe de reserva ou do telefone do serviço de entregas a domicílio deste importante item.

Não se assustem se na cozinha encontrarem a especiaria conhecida como “cravo da índia” espalhada pelos cantos. Segundo a crença da matriarca da família Amaral, o cravo afasta as formigas. Notem que não encontrarão formigas no recinto, o que deve ser uma prova quase científica de que Dona Maria Helena tem algum conhecimento na área de prevenção.

Na área de serviço há uma pequena, mas resistente e com serviços prestados que merecem láureas diversas, máquina de lavar roupa. Na emergência, mandem ver. Há cadeiras e guarda-sol, também.

As tomadas 220V estão assinaladas pela casa. Se minha memória não estiver equivocada somente duas tomadas tem esta voltagem: a da cozinha, sobre a pia, e a tomada alta localizada no quarto. Os aparelhos eletrônicos destinados a afastar os insetos podem ser utilizados nas duas voltagens. Não me lembro se há refis disponíveis, entretanto, para os mesmos (os aparelhos, se não entenderem a frase mal escrita).

A cama de casal tem um irritante colchão ortopédico, que matriarca e patriarca consideravam o ideal para as férias. É duro para caralho (como um caralho, se preferirem esta expressão). Não se acanhem, portanto, em utilizar os colchões para amenizar o impacto. Ou enfrentem o descanso na tábua, que mal não fará.


Parte III – Dicas sobre a Pérola do Atlântico

A cidade tem boa estrutura.

As praias mais próximas, a pé, são as Astúrias e a do Tombo.

A das Astúrias, que vocês chegam pelo calçadão que fica em frente a padaria La Plage, tem mais prédios e tem boa estrutura. É fácil encontrar barracas que emprestam cadeiras e guarda sol para os banhistas. Gosto de ficar na barraca do “Negão”. Mas outras também tem o mesmo serviço. A caipirinha é de limão, não inventem moda, por favor. E tem pastel, que pouca fritura não leva ninguém ao céu.

A do Tombo é mais bonita. Apesar do mar mais brabo e de ser uma praia de tombo (levem as pranchas, a praia é muito freqüentada por surfistas e pelas namoradas e namorados dos surfistas), a praia é muito simpática. Há bons quiosques por lá. E há um bistrô irregular no prédio de um hotel – irregular porque as vezes acerta bem e as vezes erra... – que vale a visita.

Para frente da Praia do Tombo, indo de carro, há a praia do Guaiúba. É bonita e tem ótimos quiosques (peixes bem feitos e bem servidos, cervejas estúpidas de gelada). É uma praia “fechada” – o carro vocês estacionam na avenida que dá acesso a praia. Vale conhecer, mesmo.

A praia das Pitangueiras é a praia central. Dá para ir a pé das Astúrias, inclusive indo pela areia, sem subir o “morro”. É bonita e tem ótima estrutura, tanto de barracas como de restaurantes a beira mar.

Para frente, seguindo das Pitangueiras, tem a famosa praia da Enseada (praia grande, com casarões. Tem bons quiosques.

Depois, tudo de carro, há as praias de Pernambuco (para muitos a mais bonita da Pérola, com casarões diversos (astros de "Caras" incluídos), Iporanga e outras. Se tiverem tempo e disposição, são praias “elegantes”.

O Guarujá não tem “choperias” como a mítica “Heinz” de Santos. Há, sim, bons restaurantes.

Entretanto, um dos chopes mais bem tirados do planeta Terra, gelado e impecavelmente colarinhado, é no Chope Halle (na avenida da Praia de Pitangueiras – Av. Marechal Deodoro da Fonseca 1520). Tem bons pratos alemães!!! Dá para ser feliz, sem receios.

Um puta restaurante, de babar, é o Joca´s. Fica na estrada para Bertioga, km 12. (que se chega indo pela praia da Enseada, Pernambuco, Perequê (nesta praia, de pescador, tem bons restaurantes para frutos do mar e pescados em geral). O Restaurante do Joca é de phoder a biela. A porção de marisco “lambe-lambe”, para começar, e cerveja gelada. Há vinhos no cardápio. O problema? É caro. E relativamente distante. E não dá para não ir de carro... o táxi é salgado... alguém vai ter que não beber... enfim... dramas.

No centro, há no final da Rua Rio de Janeiro, diversos restaurantes. Nenhum de arrebentar, mas todos razoáveis. Também no centro o “Limontino” que fica numa rua que sai da avenida da praia, próxima do Rilocenter Pitangueiras (lojinhas) pode ser boa opção para “romance” – tem música ao vivo a partir de quarta ou quinta feira). Na rua do Limontino há uma padaria bem melhor que a La Plage...

Havia uma filial do Dalmo (de Bertioga) na rua da praia da Enseada. Quando fui, século passado, era muito bom.

Como sei que o casal gosta da arte do cozinhar bem, algumas indicações: Nas proximidades do prédio, indo para o Tombo, há um mercadinho que tem produtos melhores do que os vendidos na padaria La Plage. Nada de excepcional, mas para encontrar horti fruti, frutas, temperos, pode ser uma opção.


No centro há um super mercado, no último trecho da Av. Puglisi antes da praia, que costuma ter produtos frescos e de boa qualidade.

Há um hiper mercado que tem boa variedade de produtos, embora caótico, (fica na Av. Dom Pedro – aliás, na Avenida Dom Pedro tem o “Alcide´s”, um baita restaurante de pescados – O Javali Ussit adora.)

Na Praia das Astúrias, no sentido contrário ao da Praia das Pitangueiras, onde há barquinhos de pescador ancorados, vocês estarão no caminho de uma boa peixaria: Saindo da praia – perguntem por lá, não vou conseguir explicar direito – no sentido do morro que separa Astúrias do Tombo. Sempre saíram de lá boas espécimes marinhas para o consumo na história dos Amaral.

Se tiverem de saco cheio do Guarujá, não se afobem. Na avenidona do canal, próxima do prédio, descendo no sentido contrário ao da Praia das Astúrias, vocês vão chegar numa outra avenidona (estrada qualquer coisa). Entrando a direita e sempre reto – bom trecho - vocês vão chegar na avenida que dá acesso ao “ferry boat” (a famosa balsa) que funciona 24 hs. Se paga na volta de Santos... E durante a semana não são comuns as filas nem para ir, nem para voltar.

O endereço do Heinz, mítico, templo, salvação da alma, é Rua Lincon Feliciano 104, Boqueirão (as melhores referências são os canais 4 e 5 e a avenida Washinton Luís). Se tiverem de saco cheio de dirigir, combinem com um táxi – preço fechado – ... já fiz isso (em tempos de antanho) e valeu a pena. A porção de canapé de alicce é de arrebentar corações.

Bom passeio, meus queridos.

Que quando voltarem, voltem renovados de espírito e com amor no coração e demais partes do corpo.

Beijos,

Amaral.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Miudezas e Quinquilharias



Escrevo bastante lá pelos cantos do feicebuqui e do tuíter. Uma das cousas que gosto de escrever por lá são as cotidianas dos meninos, o Grande e o Pequeno.

Os dois, na narrativa do pai. Histórias do dia a dia que ganham interpretações e escritas que me motivam ainda mais a escrever, abraçar, carinho, dengo e cafuné nas crias.

E a Vó Lena não se entusiasma pelas tais "redes sociais", mas é leitora do blogue...

Então, manhê, aos poucos, vou reproduzindo as histórias cá na quitanda.

Começo com duas, que são complementares.

Espero que gostem.

___________________________________

Publicada no dia 03/09/2012...



A brincadeira era aquele jogralzinho... "se você não me disser o nome de alguma cousa vai haver revolução". O alguma cousa da vez era "coisas que tem na cozinha".

Os meninos, eu e a Rerrê, pizzaria, numa sexta feira, noite, já depois das dez...


Começa a brincadeira e o Pequeno solta um "talheres". Eu, muito esperto, pensei com meus botões: "Bom, para adiantar a brincadeira e a gente não ficar po

r aqui por horas e horas antes disso terminar, vou restringir as opções". E mandei: "Opa! Então, com isso, não vale mais falar garfo, colher, faca. Isso tudo é talher."

Houve protestos. Mas a brincadeira seguiu....


Prato, panela, saleiro, toalha de mesa, guardanapo, toalha de papel, frigideira, liquidificador, mixer, fogão, geladeira, micro-ondas e por aí vai. Intermináveis cousas tem numa cozinha...


Eu desisti. E passei a ser o "julgador" do que valia e do que não valia.


O Grande: "Vaso de flor."


"Filho... não é toda cozinha que tem vaso. Esta não vale."


"Pai... na nossa cozinha tem. Então, vale."


Valeu.


O Pequeno: "Chão."


"Mas, filho..."


"Nem vem pai, toda cozinha tem chão. Toda."


Valeu. E valeu janela, porta, maçaneta, teto, parede...


Depois de muitas rodadas, intermináveis, já com a conta do restaurante pedida e eteceteras e tals e cousa, lousa e mariposa... o Grande: "FORMIGA!"


"Não vale!"


"Pai... não tem uma cozinha que não tenha pelo menos uma formiga. Daquelas que gostam do açucar..."


A brincadeira continuou no trajeto para casa, com o Pequeno sonado e desistindo também.


Confesso que o Grande ainda falou "cimento", o que foi aceito, embora com muitos protestos da
Renata.

Em casa, já convencido que tinha sido uma péssima idéia tolher os talheres, o Grande vence o trem, literalmente pelo cansaço.


"Filho... agora vamos dormir, né?"


"Não posso, pai. Minha religião não permite."
 
 
____________________________________
 
 
 
Depois de um jogralzinho, a brincadeira consiste em falar o nome de alguma coisa, do contrário vai haver "revolução".

"Meninos, mas o que é revolução?"

"Ah, pai, sei lá." -

"Mas vocẽs acham que é ruim ou que é bom?"

"Que é médio, pai."

Depois de uma sonora gargalhada, após as duas agudas intervenções do Grande, tentei explicar que revolução era algo que mudava, transformava, alterava uma coisa: política, cultura, valores, economia. Que existiam revoluções que poderiam ter conflitos, guerras e etc. Que revolução pode ser boa e pode ser necessária. Mas que tem gente que usa a palavra "revolução" para manter tudo como está...

"Não disse que era médio, pai?" Finalizou-se a discussão.

E continuaram a brincadeira. Depois da parlenda o desafio era indicar "o nome de alguém famoso"...

O Grande se saiu com "Einsten" (#paibalão1)

O Pequeno, rápido do gatilho: "Paul McCartney" (#paibalão2)

"Shakespeare" (#paisuperbalãoquerendoflutuar)

"Melão".

"Melão, filho? Quem é esse?" E o Grande emendou: "Meeelão?"

"Meeeelão, sim. Aquele que canta "Ela disse me assim"."

Já estava quase voando neste momento. "Jamelão!!!!"

O irmão: "É o Jamelão!"

Todos riram. E o Pequeno: "Isso, Jameeeeelão." (com voz engrossada).

Se alguém me encontrar por aí, de devolvam a âncora.

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Paula Amaral



Este texto é de 2007. E foi publicado lá nos "OsBolonistas"... Foi feito num dia 21 de agosto, para minha irmã, a Paula. 

Na verdade, o texto era para a Pi porque é uma homenagem ao Raul Seixas, que ela gosta e muito.

Raul morreu em 21 de agosto de 1989. E por essas coincidências estapafúrdias, ele morreu em seu apartamento, cujo prédio, no térreo e nos subsolos, instalava o cursinho em que eu estudava...  E eu sempre achava que aquele cara branquelo, magro, que tomava cerveja no boteco da esquina fosse um sósia...

É... #TocaRaul.

Mas também pode ser uma lembrança doutros tempos, de tempos do cursinho, de gente querida. De tempos queridos.

"Eu que não fico num trono de apartamento... Esperando a morte chegar...". É sempre bom rememorar que valhe a pena não ficar muito tempo no trono, por mais que a "taxa seja alta" vez em quando.


________________________________________



Bolonistas: Tentem Outra Vez


E já passou tanto janeiro... O São Paulo já era dirigido pelo Telê Santana. Raí já era o camisa dez, mas ainda não era Raí. Perderíamos do Vasco a final do Brasileiro, em pleno Morumbi. O Palmeiras estava na fila, ainda. O Mário Tilico tinha feito goles espíritas pelo Paulistão. O Ronaldo estava no gol do Timão. E recomece a andar.

Ouro de tolo. Era fim de tarde, cursinho. Frei Caneca. Da sala de aula começamos a ouvir violões. Uma cantoria. Músicas de um homem só. Morreu. Só podia ser isso. Aquele magrela que tomava cerveja no bar da esquina, camiseta branca, não era um sósia. Era o próprio. Era ele. Só percebemos depois das músicas. Gente sentada na rua. Muita gente. As camisetas das sociedades alternativas denunciavam. Alguns rostos choravam. A imensa maioria cantava. Fez-se uma roda na frente do prédio. Pessoas sentadas. Cantoria.

Eu prefiro ser. A metamorfose. Ambulantes. Era 21 de agosto. Era 1989. Tinha eleição naquele ano. A primeira eleição para presidente. Era outro Lula, que adorava cantar músicas dele em comícios. Eram outros sonhos. O imbecil do Gorbatchov ainda não fazia propaganda de loja de bolsa. Era o auge do fim. Da “perestroika”. Derrubaram o muro nefasto e levantaram outro, que divide o mundo entre os “modernos” e os arcaicos. Ser moderninho é legal. Tem cheiro de refrigerante sem açúcar. A velha opinião formada sobre tudo. Sobre o que é amor. Sobre o que eu nem sei quem sou. Se hoje eu te odeio, amanhã lhe tenho amor. Era época de vestibular. Era o primeiro voto. Era a nossa estrela.

Jesus, deixa o seu pai de lado. Já se falava de Jesus como mercadoria. Mas ainda era possível encontrar outros caminhos. Jesus, vai morrer tranqüilo. Já sabem do seus problemas no Imposto de Renda. Ói... ói o trem. Vem chegando de trás das montanhas azuis do Novo Aeon. Sim, éramos todos um pouco dele. Em todas as homéricas bebedeiras do mundo há sempre alguém a cantarolar que está queimando o fumo com Zezinho no fundo do quintal da escola.

Esperando a morte chegar. Dentro de um apartamento. Collor já era o caçador de marajás. A revista “Veja” já tinha lado, emporcalhado. O João Dória Júnior, do “Cansei”, já era cansado e desfilava com camisetas colloridas e “pseudo-beldades”, de plástico. Pra lua a taxa é alta, pro sol identidade. É preciso o carimbo. Alguém sabe onde está o disco voador? Quereria ir. A mosca da sopa.

Já sabem do seu plano para controlar o Estado. Qual plano? Não pense que a cabeça agüenta se você parar. Já estamos parados, há muito. Ainda comove aquele teu chaveiro escrito “love”.

Às vezes você me pergunta por que sou tão calado. Raul, sei lá onde você está. Fica bem, meu nêgo. Hoje o silêncio é para você.

21.08.2007

sábado, 11 de agosto de 2012

Não deixe o trem correr sozinho...

A quitanda reconhece que os contos, poemas, croniquetas e fusquetas estão no forno... mas estão demorando.

Entretanto, é ano de eleição. E os meus poucos leitores sabem que na quitanda também tem política e pastel de feira.

É como boteco.

E num papo de boteco, resolvo aqui expressar considerações sobre as eleições municipais de São Paulo, cidade onde moro.

E indicar um voto para vereador

O texto é longo. Mas fica o convite.

_________________________________




Sobre as eleições municipais: A Câmara Municipal não pode ficar como está.


Talvez o mais importante de uma eleição municipal seja o voto que a gente pode dar para eleger alguém para a Câmara Municipal. O tal vereador.

Sempre brinco quand
o vejo aqueles espigões, prédios enormes que rompem a harmonia do bairro sem delicadeza alguma e até com alguma desfaçatez, com uma frase: “Esse empreendimento aí tem uns dois vereadores.” É brincadeira, antes que algum nobre edil se sinta ofendido, ofendidíssimo, caluniado. Mas diz muito: Nos processos de fiscalização das ações e das políticas municipais e nos processos legislativos, é a Câmara Municipal que desempenha papel crucial para a cidade: a leniência, a conivência, a condescendência são sempre muito cruéis para com a cidade. Basta lembrar-se dos escândalos das regionais do Pitta e do Maluf. Basta olhar para a gestão Kassab e sua lista intermináveis de descasos, de proibições e de festas do setor imobiliário – A Câmara foi cúmplice em tudo. E a oposição, no caso de Kassab, por sua atuação tíbia, tímida ou inconfessável parceira, foi também responsável pela farra e pelo desgoverno.

Todo mundo gosta de esquecer a Câmara. A bem da verdade, se dá de ombros para a questão, deixando a decisão do voto e a fiscalização do exercício do mandato para terceiros e chafurdando no lugar comum de que “todos são iguais, tudo ladrão, tudo chupim.”. E a Câmara acaba se tornando uma secretaria da paróquia, apta a resolver conveniências aqui e acolá: “Tem uma árvore para podar... acho que vou pedir para o vereador fulano de tal mandar lá um ofício para a regional”. Enfim, uma lástima.

Nestas eleições, até pela característica de disputa entre tucanos e petistas - naquele papinho mole de que eles são os demônios e nós os iluminados, e vice versa – as vagas na Câmara precisam ser preenchidas com mais cuidado, zelo e precaução. A oposição que se fez ao Kassab, de uma tibieza de dar dó, dó da cidade, mostra que é absolutamente necessário garantir o contraditório, a voz destoante, a crítica, o chato e a chata, no parlamento municipal.

Assim, faço meu primeiro texto sobre as eleições de 2012 sobre as eleições para o Parlamento municipal e opino: É fundamental encontrar no voto esta capacidade de inconformismo. Um chato – ou uma chata – faz toda a diferença. Uma voz crítica eleva o debate, pode ajudar a desnudar as hipocrisias. Um voto contrário pode jogar luz numa ação obscura. Alguém que não tenha sido eleito com financiamento de bancos, imobiliárias, empreiteiras pode acordar a cidade. Basta de administrar para atender à lógica de quem financia a eleição.

Feitas estas reflexões, quero expressar minha opinião: No legislativo não dá para não votar e não recomendar o voto no PSOL. Sim, naquele partido que os jornalões chamam, pejorativamente, de nanico. O nanico que com três deputados federais consegue fazer um barulho enorme no Congresso Nacional. Três entre mais de quinhentos. Na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, terra onde nunca se instalam CPIs para fiscalizar os governos do PSDB, há um único deputado do PSOL que faz um baita barulho. No Senado, também, unzinho. Ivan Valente, Chico Alencar, Jean Wyllis, Carlos Gianazi, Randolfe Rodrigues podem ser considerados tudo: chatos, radicais, esquerdistas, moralistas. Mas ninguém duvida da seriedade com estes parlamentares exercem seus mandatos. Ninguém pode desconsiderar que nas votações polêmicas, concordando ou não com a opinião destes parlamentares, do Código Florestal à cassação do mandato do Demóstenes Torres, os parlamentares do PSOL sempre são ouvidos, ponderam, se posicionam, não fogem. Marcelo Freixo, esta raridade da política nacional, é deputado estadual pelo PSOL do Rio de Janeiro.

Eu vou votar no Gilberto Maringoni . O número dele é 50.550. A página na internet é WWW.maringonivereador.com.br

Conheço o Maringoni desde os tempos em que trabalhei com a Tereza Lajolo, na Câmara Municipal, na última década do final do século passado. Às vezes, nas discussões partidárias, ainda no PT, tivemos posições antagônicas, às vezes concordamos. Mas ele sempre foi correto nas relações políticas, coerente e sempre, sempre, se posicionou. Não tem medo de não agradar, o que um enorme passo para convencer acerca da qualidade deste voto. Cartunista, faz rir com críticas ácidas e que nos fazem pensar, refletir, dialogar. Historiador. Político. Sim, precisamos de mais políticos na Câmara e menos de párocos interessados nas relações mesquinhas de poder e de manutenção de espaços e mandatos. É isso. Quem quiser falar mais de política, perguntar, debater, criticar, me procure por aqui, por email, no blogue, no boteco. Quem sabe a gente não vai numa reunião do Maringoni, juntos?

É isso aí.

12. agosto.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

"O tal julgamento do século"


Bom.... tem um monte de conto começado... alguns poemas largados...

Mas a cabeça as vezes precisa ajudar o fígado...

Então, escrevo neste boteco sobre um tema que me deixa emputecido. Mas enfrentar fantasmas é um bom mecanismo para derrotá-los.

Segue lá...

________________________________________




A partir de amanhã voltaremos aos monocórdios...

O julgamento do tal crime do século, o "mensalão", tomará conta do noticiário. Será a luta do bem contra o mal, o trololó do "só acontece no Brasil" e cousas do gênero.

Odeio o "mensalão". Por inúmeras razões o considero um dos mais execráveis exemplos de como estamos perdendo nossa capacidade de crítica e de reflexão em nome de uma estúpida – repito, estúpida - guerra de torcidas.

O episódio é, sim, um divisor de águas importante. Uma parcela do PT ruiu com o episódio. Entretanto, não foi a ocorrência ou não do valerioduto a responsável pela saída, pelo distanciamento, pela ojeriza. Houve um processo de degeneração em que o mensalão pode ser considerado a cereja do bolo, o broche que puiu o vestido. É este processo que deveria ser enfrentado por todos, com coragem, que fizeram e fazem parte do PT e que fizeram e fazem parte da esquerda no país.

O "mensalão" como mesada para parlamentares no Congresso Nacional parece que não existiu. Não há provas da mesada. Não há ligações das votações no congresso e os recebimentos de numerários por parlamentares. Ademais, muitos parlamentares agraciados eram do partido do governo o que dá a tese da mesada um status de carochinha. Bom, mas, porém, contudo, entretanto, é tão evidente quanto à luz do sol que o episódio não se restringiu a um "mero" caixa dois de campanha, de "financiamento ilegal de campanhas políticas". Este é o maior equívoco do PT: tapar a luz do sol. Circularam recursos provenientes de diversas fontes para abastecer cofres de partidos e de políticos e houve, sim, enriquecimento de alguns. Ora, o enriquecimento se prova pela alteração de "status" social, pela mudança de hábitos, pelo aumento do "consumo". E houve, sim, a utilização desses recursos como forma de pressionar e criar uma "maioria" parlamentar - do tipo, "olha lá como vota porque do contrário àquela sua dívida de campanha não será quitada..." - e uma folgada maioria partidária, interna - do tipo “olha lá como vota porque do contrário àquela sua dívida de campanha não será quitada”.

Mas o mais nojento do episódio é a demonstração da "nossa indignação seletiva". O movimento de combate à corrupção passa a ser na grande mídia (paremos com esta bazófia de PIG, esta bobagem inventada para justificar o injustificável) um movimento de desgaste do PT e do Lula, somente. Não se fazem matérias sobre a compra de votos no processo que alterou a Constituição da República para conferir à FHC a possibilidade da reeleição. Não repercutiram as denúncias sobre as falcatruas generalizadas, amplas e irrestritas dos processos de privatização. Não se fala da Alstom e das obras do metropolitano em São Paulo. Nunca mais se falou da inspeção veicular na cidade de São Paulo.

Agora chegou a hora do julgamento no STF. O que é outra excrescência, em razão do julgamento só ocorrer na Corte Constitucional em razão da insensatez do "foro privilegiado". Mas, na regra do jogo, que o julgamento seja o que deve ser. Que dentro do que está comprovado nos autos, seja a mesada, seja a cooptação, seja o caixa dois, seja o diacho a quatro, punidos e com o rigor que a lei exige. Que nos casos onde a prova foi impossível, que a regra do direito valha acima das regras de conveniências da "opinião pública".

Mas, sobretudo, que tenhamos coragem de sair deste episódio com menos cinismo. Que comecemos a exigir o financiamento público de campanha e mandar para o ostracismo aqueles que convenientemente deixam este debate ao relento, tanto nos partidos como no Congresso Nacional. Que comecemos a entender que as regras do processo eleitoral devem ser rígidas, mas devem ser de fácil interpretação, que não dependam de interpretações de gente iluminada. Que comecemos a enfrentar, de fato, a questão da democratização dos meios de comunicação, com o intuito de estimular a pluralidade de opiniões e diminuir espaços para calúnias, difamações, falatórios, fofocas nos meios de informação e formação de opinião. Que discutamos as razões da publicidade oficial, afinal o "valerioduto" - o tucano de Minas e o petista - nasceram da utilização de uma "agência de publicidade" como "intermediária" das operações, ser tão custosa, tão cara e tão desregulamentada (o princípio da impessoalidade é ofendido em grassa maioria das propagandas chamadas institucionais).

E que o PT saia da letargia, deixe de colocar a culpa em outrem, e entenda que não dá para fugir deste debate em nome de uma "pseudo" superioridade programática. Há que se reconhecer que no mínimo houve um grotesco, um gigante, um monumental erro político. Que este erro custou muito caro ao partido. E, porque não, custou muito caro à nossa história.

Por fim, o texto é repleto de ironias. Ter que explicar ironia mostra que o texto está é malfeito. Neste caso, este palpiteiro pede perdão. É o fígado que escreve. Odeio o “mensalão”.

agosto, 01. 2012.

sexta-feira, 1 de junho de 2012

As cinzas de uma cidade

Escrevi estas linhas no tal do feicebuqui. Mas é que tem coisa que deixa a gente triste. É preciso escrever, um exercício para desopilar o fígado.

São Paulo, a cidade, o estado: O que estamos fazendo com a gente? Cinzamente.

____________________________





São Paulo está uma cidade feia. Que enfeia a cada dia. Que fica cinza asfalto, cinza vida, cinza hipócrita.

Fecharam o Bar do Binho...
http://marcelinofreire.wordpress.com/2012/06/01/binho-moinho-pinheirinho-2/


Quem não conhece o "Sarau do Binho" desconhece talvez uma das mais interessantes manifestações culturais que acontecem na parte bela de São Paulo: Os saraus. É o Cooperifa, organizado poeta Sergio Vaz (
http://www.colecionadordepedras1.blogspot.com.br/), é o Sarau do Fundão, é o Sarau do Binho, e são outros entre outros.

Nesses lugares afastados da Berrini, da Vila Olímpia, dos Pinheiros, da Paulista, da descolada Vila Madá, pessoas se encontram para declamar, contar, cantar, vivenciar.
Pois bem, o Binho não conseguiu “regularizar” sua situação com a Prefeitura, a despeito de uma luta inglória contra a burocracia. A Sub Prefeitura do Campo Limpo foi lá e prum: mandou fechar.

http://www.redebrasilatual.com.br/temas/cidades/2012/05/kassab-fecha-bar-do-sarau-do-binho

Tudo pela lei! Ora, a lei...

Ora, pelotas! Recentemente um empreendimento imobiliário recebeu “carta branca” do prefeito, mesmo descumprindo as contrapartidas que legislação municipal exige dos chamados “polos geradores de tráfego” (não confundir com tráfico, de influência). Separei algumas matérias do Estadão que contam a novela do “shopping JK” para formular um singelo convite aos que tiverem paciência de ler este desabafo figadal:

1) Em razão da fiscalização da prefeitura e do Ministério Público, o shopping JK não tem licença de funcionamento. A matéria tece loas ao empreendimento e menciona os “prejuízos” e a “decepção dos investidores estrangeiros”

http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,e-so-na--minha--esquina-que-tem-transito-,863165,0.htm

http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,multa-diaria-de-r-500-mil-sera-anulada-,874933,0.htm

2) O Prefeito recua, muda de ideia e dá “sinal verde” para a abertura do shopping...
http://www.estadao.com.br/noticias/geral,prefeito-autoriza-abertura-do-shopping-jk-iguatemi,875098,0.htm

3) O shopping ainda não foi aberto, porque o MP não entrou na lorota e porque não há base legal para tanto, apesar dos esforços do prefeito para encontrar “brechas jurídicas” para a tão sonhada inauguração de mais um templo na cidade:

http://www.estadao.com.br/noticias/cidades,prazo-para-abertura-do-shopping-jk-continua-indefinido,881082,0.htm

Eis aqui o meu convite: Debater como Binho e o dono do shopping são tratados pelo poder público. Discutir como um e outro têm acesso ao poder público. Analisar como um e outro episódio são tratados pelos jornais, pela imprensa. Um clamor ao debate de qual é o papel de anunciantes na política editorial dos órgãos de imprensa. Um convite para enfrentarmos a questão do financiamento das campanhas eleitorais.

Enfim, concluo: O fechamento do Binho é mais uma demonstração cabal da lógica podre, nojenta, excludente e feroz que é a marca desta administração municipal, a de Serra e a de Kassab, pois uma só existe em decorrência da outra. Talvez Binho não tivesse a proteção da “Santa Imaculada da Especulação Imobiliária”, uma santa “empreendedora” que é a santa de devoção do atual alcaide e de tantos outros por aí.

Ou Talvez o colorido do shopping seja tão tamanho que ofusque e as coisas ofuscadas tendem a ter o mesmíssimo tom: cinza.
 

12. junho, 01. 

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Diamantes são eternos


Foi num 24 de maio, em 1942, que Leônidas da Silva, o Diamante Negro, fez sua estréia no São Paulo Futebol Clube. Leônidas é um dos deuses do ludopédio e é o melhor jogador de futebol de todos os tempos, segundo todos os compêndios de futebol no universo. No meu time de botão é o nove (o dez é o Raí, óbvio).

Fiz este texto depois de outra estréia. A do Marco Antônio no Cícero Pompeu de Toledo, em 2006. Um dia especialíssimo e que rendeu estas linhas que originalmente foram publicadas no Blogue "Os Bolonistas".

O link para o original, aqui: http://osbolonistas.zip.net/arch2006-02-01_2006-02-28.html#2006_02-01_12_42_41-2402205-25


__________________________________________




Bolonistas que sabem que nem tudo é Copa do Mundo,



Há quem faça comparações entre Leônidas e Pelé. O teipe, a melhor invenção para a memória, não favoreceu o Diamante, o que é uma pena. Mas diria que Pelé é daqueles que todos acham a mesma coisa, inclusive o Romário, que ele era melhor e tal cousa, lousa e mariposa. Era, não contesto. Mas há quem faça comparações entre Leônidas e Pelé, há.


Leônidas inventou a bicicleta. Inventou? Não é verdade. Dizem alguns que a bicicleta já existia em algum campo por aí. Mas Leônidas fez da bicicleta uma jogada habitual, corriqueira, fantástica. Jogou duas copas, o que é uma pena. Deveria ter jogado mais. Os mais velhos diziam que ele era um comentarista muito do ranzinza. Depois de craque, virou comentarista de rádio. Não duvido. Mas, ranzinza ou não, deviam ser comentários preciosos. A bicicleta tem lá suas variações. Os mais puristas afirmam que bicicleta mesmo é aquela que os dois pés estão fora do chão. Daí a puxeta. Prefiro não ser ortodoxo porque a bicicleta é das poucas jogadas que não existem no futebol de botão.


O velho inventor jogou no São Paulo. Foi campeão. Seus jogos no Estádio Municipal lotavam. Quando aportou na cidade, de trem, a estação ferroviária estava repleta. Foi uma festa. É dos maiores artilheiros do Tricolor. Fez goles de bicicleta pelo mais querido.


Um verdadeiro crime não ensinarem histórias do futebol nas salas de aula. Devíamos ter uma matéria específica sobre este tema nos currículos escolares. Tenho receio que Fried, Leônidas, Rui, Bauer, Noronha e Sastre fiquem anônimos. Concordo que a matéria não deva ser obrigatória, alguns preferem jogos de videogame. Respeito a todos, mas não entendo. A aula de histórias do futebol seria sempre a última aula antes do recreio ou antes de acabarem as aulas, para os estudantes exercitarem nos corredores ou nas quadras os ensinamentos. O material didático seriam as figurinhas para a prática do bafo, times de futebol de botão, planilhas de esquemas táticos desenhadas a mão. As estudantes entenderiam um pouco mais sobre este tema que as enlouquecem todos os domingos, ganhariam vários pontos e, quem sabe, um jantar a luz de velas no futuro próximo. Poderíamos até discutir a relação, sem traumas.


Estes pensamentos soltos me ocorrem quando vejo o grande dando os seus pontapés na pelota, na sala do apartamento. Chutes que invadem o corredor, batem no carrinho do pequeno, ajudam a mãe a tropeçar. Ele arremessa a bola para o ar, com as mãos e cai no chão. Outro dia disse: "Pai, sou goleiro". Poy, Pedrosa, Sérgio, Barbosa, Castilho, Valdir Peres, Toinho, Gilmar Rinaldi, Gilmar dos Santos. Rogério Ceni e Zetti. A galeria é enorme, penso eu. Será que ele vai se interessar pelo tema, quando as meninas chegarem na vida dele? Quando ele descobrir a bicicleta e a liberdade, a sessão de cinema, a matinê, os "bailinhos", o grêmio escolar? E o pequeno? Será que vai gostar? Quero ir ao parque com eles. "Chuta a bola, papai". "Chuta". A bola quase derruba o vaso sobre a mesinha de centro. Tiro o vaso e a mesinha, instinto.


Nas aulas de histórias do futebol também haverá espaço para aquela reunião com os pais e mestres. A escola convidará mestres para participarem dos colóquios entre professores, pais e estudantes. Nesse dia me lembro que o Mestre convidado a participar da reunião era o Mineiro, volante do tricolor em meados da primeira década do século, autor daquele gol maravilhoso contra o Liverpool, que conferiu a terceira estrela de campeão mundial. O Mineiro, com aquele jeitão simples dele, tão campeão e tão modesto, contando causos da bola, falando de craques e vestindo uma camisa sete. O grande dispara uma pergunta, com um sorriso maroto, me deixando desconcentrado: "Mineiro, qual o gol mais bonito que você fez?". Silêncio. Fiquei compenetrado. "Menino, lembro até da data. 21 de janeiro de 2006. Morumbi. Era o primeiro jogo depois do Mundial que fazíamos no nosso estádio. O jogo era contra o São Caetano. Estava difícil, sabe. O time tentava, o Tiago fazia um bom jogo e a bola não entrava. O goleiro deles, o nome dele era Silvio Luís, estava num dia daqueles. Uma bola já tinha ido parar na trave. Foi num desses ataques, o Grafite mandou outro balaço na trave, na volta da bola percebi que não tinha jeito. Ou melhor tinha, o jeito era tentar a bicicleta. E olha, foi exata. Pé na pelota, corpo no ar e golaço. Foi o gol mais bonito que fiz." Vi até umas lágrimas nos olhos do bravo volante. "Mineiro, eu sei. Estava lá com o papai." O menino sorri. As lágrimas, percebi, não eram do volante.


Há quem faça comparações entre Leônidas e Pelé. Eu não faço. Mas acho que o Leônidas inventou a bicicleta, o que para mim é o mais importante.



01.02.06 – São Paulo 2 x 1 São Caetano, 21 de janeiro de 2006. Estréia do Marco Antônio no Cícero Pompeu de Toledo. E o gol do Mineiro, de bicicleta, aqui: http://www.youtube.com/watch?v=oWRNCzvO6i4