segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

"Paiê... sabe de uma coisa... eu acho que..............."



Era quase meia noite. Um sono lascado, naquele coça coça os olhos. Uma luta, enfim, para se manter acordado. Tá certo, era Kevin Arnold e Winie Cooper na telinha e era visível a empolgação com a descoberta da série “Anos Incríveis”, mas tinha alguma luta a mais ali. Era para não dormir.

“Filho, cê tá com fome? Quer comer uma coisa antes de ir dormir?”

Disse que não. O irmão também fez cara de não quero.

“Pai, é que eu estou esperando alguma coisa fantástica!”

Fiquei martelando a frase. Seria sobre a série, sobre o mundo, sobre experiências quaisquer?

“Tipo um homem aparecer com um grande saco de pum integaláctico.” E riu, evidentemente.

De repente, berrou:

“Já é 27!!!!”.

Sim, já era vinte e sete.

“Oooopa.... seu aniversário!”

E o Grande, então, pode começar a comemorar o seu décimo aniversário. Uma década! Pulei nele, abracei, disse amores todos. Ele sorria. O irmão, fingindo indiferença, ficou no meio do abraço. E disse: “parabéns.”

A casa toda, meia noite. Já era 27.

Talvez um dia, moleque, você resolva ler as cousas que seu pai escreve. E escreve muito sobre você, sobre teu irmão. E vai parar neste texto aqui, escrito no dia do seu décimo aniversário. E saiba, filhão, que é muito bom, muito bonito, muito linda nossa história. Afeto, de uma maneira que descrever com letrinhas talvez não seja possível. Afinal, abraço também foi inventado para isso.

Lembro da semana que teu irmão nasceu, Marco. Acho que foi o segundo ou terceiro dia de hospital. O Leonel teve lá uns probleminhas com açúcar e ficou no berçário, naquela ala de cuidados intensivos. Um homenzarrão no meio daqueles bebês prematuros. Mas eram cuidados necessários. Enfim, estávamos acabrunhados e um tanto preocupados, eu e sua mãe. O fato é que lá pelas tantas da noite eu e você fomos jantar, perto do hospital. Lá no Almanara do Shopping Paulista. Eu e você. Nos sentamos ali numa mesa, de canto. Você tinha quase dois anos. Mas falava como matraca. Tinha repertório, verbos, substantivos. E a gente conversou, conversou, conversou. Não paramos de falar. O assunto, mentiria se dissesse que me lembro qual foi - mas saiba que desde cedo você gostava de maravilhas, de contar e imaginar cousas fantásticas, seres diferentes e que provalmente fizemos digressões sobre a vida... Foi quando uma senhora, na mesa ao lado, que espiava tudo sem que eu pudesse me dar conta, me chamou e soltou a frase: “Puxa... que lindo isso, vocês dois conversando assim. Parabéns.”.

Então, molecão, é isso. A gente, depois de um tempo, acaba se acostumando com o mundo. E isso nem é bom, nem ruim, é médio. Meridiano. Comum. Acaba aceitando coisas, acaba se resignando, acaba falando palavras difíceis para dizer que nos acomodamos. E aí a gente descobre que não. Que tem alguém disposto a nos ouvir, a conversar, a entender e, porque não, a não aceitar. Seu pai não é o mesmo aos trinta e uns do que é aos quarenta e uns. E você e seu irmão descobriram alguém que ainda é capaz de repensar, reformular, ressonhar – e os olhinhos de vocês e esse conversê maluco da gente são instrumentos essencias disso tudo.

Você, meu Grande, meus olhos de jaboticaba, é o menino que, depois do banho, numa quase noite na casa do papai – a gente, eu e a mamãe já estávamos em casas diferentes – soltou uma das frases mais bonitas de todos os tempos, incluíndo os imemoriais:

Acho que é isso, Tó. Um grande carrossel, girando. A única cousa que acrescento: Vocês fazem este carrossel girar, mas nunca um fiozinho volta ao mesmo lugar. E isso é magia, mágico e daria para entrar em Hogwarts, fácil fácil.

Parabéns, neguinho.

27.01.2014

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